____________________________________________________________________


O melhor filme já feito? Não me atrevo a responder, mas posso dizer que entendo por que provoca tamanho entusiasmo no espectador. Porque é um filme sobre família. Se as ações da máfia são abomináveis, o amor entre os Corleone é resignador. Por isso, com algum tempo de filme estamos absolutamente à vontade com as chantagens, opressões e assassinatos. Passamos a fazer parte da família e admitimos matar se o objetivo é proteger um filho ou um irmão. Isso não é obra do acaso, mas de um roteiro e uma direção de atores obsessivamente perfeitos. Tente listar todos os personagens de um filme que viu recentemente? Não é uma tarefa fácil já que a unidimensionalidade toma conta dos roteiros atuais em busca da fácil aceitação do público através de emoções ditadas: o nerd vai lhe fazer rir, a popular da escola você deve odiar, e por aí vai. Em O Poderoso Chefão, o estereótipo não existe e somos apresentados à humanidade de cada um. Seja mafioso ou herói de guerra, todos têm sentimentos, e por isso cometem erros e acertos, dentro da realidade em que foram construídos. E é contraditoriamente o herói de guerra, Michael Corleone, filho abastado que nunca se envolveu nos negócios do pai, que se mostra pródigo quando vê a família ameaçada e torna-se paulatinamente o novo poderoso chefão. Esse processo gradual que rendeu uma indicação ao Oscar a Al Pacino pode ser comparado à atuação genial de Liam Neeson como Oskar Schindler. Por fim, deve ter quem se conforte com sua profissão socialmente aceitável, mas perceba que no tratamento à família, tem muito o que aprender com os Corleone. Sem dúvida, um poderoso filme.
____________________________________________________________________


Essa comédia romântica de título relativamente constrangedor, não tem nada do que se envergonhar. P.S.: Eu te amo provoca emoções naturais, levando do riso às lágrimas em questão de minutos. Com personagens carismáticos e relacionamentos complexos, o filme se sustenta com as expectativas geradas por sua ótima história. Holly (Hillary Swank) enfrenta uma crise financeira no casamento com Gerry (Gerard Butler), obcecada com uma estabilidade que lhe possibilite ser mãe. E é a morte prematura de Gerry que acende o estopim para uma transformação na vida de Holly. Só que o P.S. dessa história diz que as mudanças não precisam vir necessariamente com o sofrimento. É muito mais fácil e produtivo usar o amor. Mesmo depois da morte.
____________________________________________________________________

FIM DOS TEMPOS - Nota: 5,0

Dos três filmes que vi esse final de semana, o que mais me chamou a atenção pode ser considerado o pior entre eles. Fim dos tempos escreve mais uma vez tese sobre a extinção humana. Roteirizado, produzido e dirigido por M. Night Shyamalan, foi achocalhado pela crítica como o fim dos tempos para o cineasta. Não discordo de seus problemas de roteiro e direção, ambos amadores demais para alguém que foi precocemente exaltado como o novo Hitchcock, por seus dramas psicológicos com toques sobrenaturais nos brilhantes O Sexto Sentido e O Corpo Fechado e nos bons A Vila e Sinais. (A Dama na Água é um caso a parte, já que me diverti à beça). O filme começa com uma onda de suicídios em Nova York, precedido de perda de orientação e capacidade cognitiva das supostas vítimas. As cenas iniciais são assustadoras. As especulações para a causa do “acontecido” (The Happening, título original) vão de atentado terrorista e vazamentos nucleares a uma possível toxina liberada pelas plantas, numa sugestão de vingança da natureza contra os abusos humanos.
A expectativa por uma explicação plausível gerada pelo choque inicial vai se diluindo numa narrativa expositiva, que teima em dar explicações a todo o momento, através de diálogos risíveis e chamadas jornalísticas exaustivas. E isso acontece tanto na explicação para o fenômeno quanto numa superficial subtrama amorosa. O professor de ciências Elliot Moore (Mark Wahlberg) é casado com Alma (Zooey Deschanel), mulher com dificuldades para expor seus sentimentos e claramente infeliz no casamento. Mas Zooey não consegue emprestar nenhuma profundidade à personagem, que ao dizer que tem tal dificuldade parece não ter sentimento nenhum. Assim como ela, roteiro e direção falham em não conseguir estabelecer relação emocional do público com nenhum personagem, fator essencial numa obra como essa. Se não me importo com os personagens, que morram! A sobrinha do casal, outro exemplo, está ali como mero artifício para conquistar nossa compaixão. Não consegue.
O foco na angústia humana, indo na contracorrente dos filmes de catástrofe que apelam para a destruição e salvação em massa é uma característica admirável no trabalho de Shyamalan. Só que nesse Fim dos tempos, ele obviamente duvida da inteligência de seu público quando coloca Elliot (Wahlberg) como um professor de ciências que precisa equilibrar seu problema no casamento com a busca por explicações para os suicídios. E nas duas tentativas se sai muito mal. Ele conclui que a substância causadora, ou seja lá o que for, provavelmente vem das plantas já que os ataques começaram em parques, que é levada pelo vento e que atinge grupos grandes de pessoas, já que começou em grandes centros urbanos e foi se expandindo para cidades cada vez menores. Sim, eu sei que é exigir muito de sua imaginação. E tem mais. Na tentativa de fugir, eles ficam presos com dezenas de outras pessoas em uma zona rural no centro da contaminação. Após as conclusões geniais do professor, decidem se separar em grupos menores, e começam desesperadamente a correr...DO VENTO. (Se quiser assistir, não continue lendo). Só que o vento é mais rápido (oh God) e sobram apenas Elliot, Alma e a tal sobrinha. Encontram uma casa onde uma senhora aparentemente sem comunicação com o mundo há anos, vive sozinha. Ela também é contaminada e os sobreviventes ficam presos em dois cômodos externos separados, mas onde conseguem se comunicar através de um cano. É aí que marido e mulher descobrem o quanto se amam, e que se for pra morrer, que morram juntos. Decidem enfrentar O VENTO DO MAL e então...são poupados, a vida volta ao normal e ela descobre que está grávida. Foi aí que muita gente se perguntou: tá, mas e aí? Aí que residem interessantíssimas reflexões camufladas pelo roteiro preguiçoso de Shyamalan, que, no entanto mostra ser um homem de profundas reflexões sobre as razões da existência humana.
NOVOS TEMPOS
Fim dos tempos não era pra ser um filme sobre apocalipse ou revolta da natureza. Era pra ser um filme sobre iluminação. As pessoas estão caminhando num parque e de repente param, olham para o nada sem saber onde estão ou para onde estão indo e se matam. O que faz elas se matarem não é uma toxina produzida pelas plantas como vingança por nosso abuso ambiental. É uma retomada de consciência. Sei que precisamos de explicações lineares e lógicas para tudo que nos acontece. Mas já parou pra pensar que as maiores transformações de sua vida acontecem de dentro para fora? É uma sequência de consciência, culpa, arrependimento e reação que sempre guia nossas atitudes após uma certa experiência de vida acumulada. Shyamalan propõe uma leitura metafórica e subliminar para uma iluminação individual com a pergunta “por que eu mereço viver?”. O fato de estarem num parque poderia ter ficado subentendido como uma alegoria ao nosso modo de nos relacionarmos com o planeta. Mas explicar tanto e dar-nos uma origem eliminável para os suicídios foi o erro de Shyamalan, mesmo porque ainda viriam várias outras boas lições a serem retiradas de um filme estruturalmente ruim.
Num certo momento, as pessoas decidem se afastar já que a contaminação parece atingir primeiro, os grupos maiores. Repare como isto é triste e belo. Somos seres que se aproximam dos outros na bonança e evitamos problemas que não são nossos. Somos individualistas na busca por realizações pessoais e coletivos em momentos de necessidade. Isso, associado à figura simbólica da idosa que vivia sozinha mas se mostrava egoísta e infeliz é a deixa para a redenção que faz todo sentido no fim das contas de Fim dos tempos. Não temos que enfrentar nossos problemas sozinhos, mas precisamos ajudar os outros a enfrentarem os seus. Quando marido e mulher decidem enfrentar a morte juntos e são poupados, não o são pelo vento. São salvos por uma retomada de consciência, que se culpou, arrependeu-se, e reagiu respondendo a si mesma: “eu mereço mais uma chance”. Pode soar piegas, mas tenho minhas convicções claras de que isso fará todo sentido num futuro próximo. Não com o filme de Shyamalan, que fez exatamente o contrário, rendendo-se ao exibicionismo e discurso fácil. Espero que ele também retome sua consciência. Temos muito o que esperar de um dos mais complexos e inventivos cineastas desta geração. Que venham seus novos tempos.
____________________________________________________________________